Capa - Parte I
 
Entrevista: Tayane Sampaio
Fotografia: Clarissa Mendes 
  

Entrevistamos Gustavo Bertoni, jovem brasiliense que, após fazer sucesso nas quadras, conquistou os palcos da Cidade. Ele foi atleta do Colégio Mackenzie e da Lance Livre Esportes e, em 2009, com a descoberta de um problema de saúde, teve que encerrar a carreira no esporte de forma prematura. No entanto, essa mudança fez com que Gustavo canalizasse suas energias para uma nova paixão: a música. Desde então, acompanhado de seu irmão, Tomás Bertoni, e dos amigos Lucas Furtado e Philipe Conde, Gustavo integra a Scalene, banda que a cada dia conquista mais fãs pelo país, por meio de seu trabalho bem elaborado e consistente.

Numa conversa descontraída, Gustavo nos contou sua história, falou sobre a transição do basquete para a música e deixou mensagens importantes para nossos atletas. Dividimos a entrevista em duas partes: na primeira, exploramos a trajetória do Gustavo no basquete e, na segunda, o foco será a música..

Conte um pouco sobre a sua trajetória no basquete.

Por volta dos meus oito anos, praticava futebol, natação, um pouco de tudo, mas eu gostava mais de futebol. Meu irmão, Tomás, começou a fazer aulas de basquete e por causa dele eu também fui, mas meu pai foi quem incentivou mesmo, porque ele jogava e gostava muito de basquete. Comecei a jogar e me apaixonei rapidamente, queria comprar todos os DVD’s e assistir vídeos o dia inteiro. Minha vida era aquilo. Comecei jogando no Mackenzie, com o Cantu (técnico Luiz Gustavo Cantuária), que é amigão até hoje. Joguei uns três anos só no Mackenzie e aí eu comecei a fazer uns jogos no Lance Livre, por convite do Marcão. Fui disputar um campeonato com eles em Novo Hamburgo e a partir daí que me transferi de vez para o Lance Livre. Lá era outro esquema, porque o nível dos jogadores estava muito alto. Joguei com o Pitoco, Raphael, “Cunha” (Luiz Gustavo) e Thiagão, que eram os titulares, e o sexto homem, o Breno. Os moleques jogavam demais! Era muito divertido jogar com eles, porque o entrosamento era sinistro. Nós ganhamos Sul-Americano, Copa Minas de BH, ganhamos do Pinheiros, do Fluminense, de todos esses clubes que na época eram considerados os melhores na nossa categoria.  Digamos que, no meu auge, quando comecei a jogar na Seleção do DF, descobri que tinha um problema no coração, que é uma válvula bicúspide, e estava com insuficiência cardíaca. A partir daí, avisei meus técnicos, mas o problema ainda era muito pequeno, então eu não tive que parar de jogar, só fui cortando um treino ou outro. Quando ficava muito intenso, eu descansava, mas continuei seguindo. Nessa época, fui convocado para a Seleção Brasileira e viajei com o Pitoco para treinar no Rio de Janeiro.  Lá foi muito interessante, uma grande experiência. Nós ficamos treinando só com gente top e eu me lembro de ter sido muito, muito legal, mas quando voltei não fui convocado. Aos poucos, precisei cortar um treino ou outro da minha rotina, por causa do problema do coração. E foi uma coincidência maravilhosa eu ter começado a compor e a tocar com a banda nesse tempo. Quando eu estava começando a desistir do basquete profissional – porque claro que eu sonhava em ser jogador de basquete –, começou a surgir a banda. Então, isso fez a transição ser muito mais suave. Depois, quando parei de jogar, não ficou aquele vazio existencial.

Você sempre se destacou como atleta e conquistou vários títulos. Qual foi o título ou partida mais marcante para você e por quê?

Eu diria que não foi um título. Acho que o campeonato mais marcante foi o Campeonato Brasileiro de Base de 2008, quando o nível da coisa estava alto e nós jogamos muito bem. A gente tinha time para ganhar de Minas na semifinal e deu mole. Como a final já estava na nossa cabeça, não conseguimos manter a energia na disputa de terceiro lugar, contra o Rio de Janeiro, e ficamos em quarto. Saí com o sentimento de que nós estávamos entre os três melhores times do Brasil e isso foi o mais marcante para mim. Teve também o campeonato em que fui cestinha do 92 (eu sou 93) e cheguei no terceiro lugar com o Mackenzie. Marcou bastante e eu me lembro que ganhei uma confiança enorme para seguir. E partida foi uma em que fiz 58 pontos, meti oito bolas de três…  eu me lembro muito bem dessa partida, foi muito legal e estava com a mão boa naquele dia.

Quem é o seu ídolo no basquete?

Michael Jordan, sem dúvida alguma!

E jogador brasileiro, tem algum que você admira?

Passei a gostar muito do Tiago Splitter. Eu implicava com ele, achava meio “mão mole” para a NBA, que faltava vigor. Agora, estou acompanhando mais os playoffs e ele tá muito bem… então, acho que ele é meu jogador brasileiro preferido. Gosto muito do Leandrinho, também.

Em sua opinião, quais benefícios o NBA Global Games pode trazer para o basquete brasileiro?

Não só dá oportunidade para a criançada, que está começando, ver um basquete de alto nível, mas também para os pais perceberem como a disciplina e a seriedade ficam transparentes quando a gente vê o jeito de jogar e de se comportar dos profissionais da NBA. Acho que ver de perto talvez desperte isso no brasileiro. O profissionalismo deles está acima do nosso, isso é fato, e por isso jogam o melhor basquete do mundo. E tem toda uma parte de marketing da coisa, que se o brasileiro soubesse aproveitar seria ótimo, porque o estadunidense sabe vender muito bem o esporte e implantar isso na cultura. O jogo de basquete da NBA é um espetáculo. Às vezes, uma pessoa nem é super fã de basquete, mas é muito legal ver. Se eles trouxerem essa estrutura para o Brasil e a gente adotar, vai dar um ar mais profissional, de espetáculo para o basquete brasileiro, que eu acho muito bom. É muito atraente para o público. Isso gera dinheiro, que leva à estrutura e é um processo cíclico: se entra dinheiro por via do entretenimento, vai chegar de alguma forma no treinamento da garotada. Então, eu acho muito, muito legal.

Você ainda tem uma relação forte com o basquete?

Sim. Isso tem até melhorado nos últimos dois anos. Deixei o basquete de lado, por um tempo, até para me focar na música, mas acho que a banda chegou num nível melhor e mais estável, onde nós temos mais organização, com pessoas trabalhando com e para a gente. Então, estou com um pouquinho mais de tempo. Antes era “preciso melhorar, preciso estudar”… hoje, já estou mais focado para melhorar em coisas específicas e não na coisa toda. Assisto o máximo de jogos que posso e jogo sempre que dá. Tenho uma quadra aqui em casa, então chamo meus amigos e jogamos, aos domingos. Na sexta-feira, vou à Companhia Athletica jogar com uma galera de lá. Acho bem importante e me distraio bastante.

 O que você aprendeu com o basquete?

Eu aprendi a trabalhar em equipe, ainda mais nos tempos de Lance Livre e Seleção, onde todo mundo estava no mesmo nível. Tinha muito a coisa de ajudar um ao outro e saber quando era seu momento de fazer uma jogada individual, quando era para jogar pro time… uma coisa só funcionava se estivesse todo mundo na mesma página. E com a banda é muito parecido, a convivência é igualmente intensa. O treinamento, na verdade, é o ensaio, o jogo é o show, então, acho muito parecido e essa cooperação que faz a coisa andar pra frente eu trouxe do basquete. Também garra e disciplina. Não sou a pessoa mais disciplinada e não era o cara que ia lá e batia os cem lances livres seguidos, mas eu ficava tanto tempo treinando que acabava batendo uns oitenta só de ficar jogando e treinando sempre. Levei isso para a música e estou sempre tocando. Mesmo assistindo TV, pego o violão e toco.

Que conselho você daria para quem está começando no basquete?

Acho que o primeiro passo é viver o basquete. Não é só questão de treinar terça e quinta ou segunda, quarta e sexta e achar que isso vai bastar. Tem que, antes de começar, pensar em como você vai se comportar no treino, chegar mais cedo, alongar… você tem que viver aquilo, tem que sempre estar disposto a dar o seu máximo. E uma coisa que acho que ajuda muito é assistir jogos nacionais e internacionais… assistir o máximo de jogos que você puder, ver como as coisas funcionam no profissional, tentar tirar o que você pode e treinar muito. E acreditar que você pode chegar aonde quer. Acho que não duvidar de si mesmo é extremamente importante em qualquer coisa que você faz. Por mais que seja uma coisa meio clichê, meio utópica, eu acho que se você vai para o treino e, no fundo, na sua cabeça, está acreditando que vai se tornar um jogador profissional, dá muito mais do que se estiver indo só como hobby. Então, meu conselho seria dar cem por cento ou nem dar nada.

 

SITE | LOJA | YOUTUBE | FACEBOOK | TWITTER | INSTAGRAM

.

Veja: vídeo com jogadas do Gustavo Bertoni na Seleção Sub-15 do DF, de 2008. A música é Sonhador II, da banda Scalene, com interpretação do próprio Gustavo:

.

.